01 novembro 2005
Jardim do Hojo, visão de conjunto. (Hojo é o conjunto das instalações do monge abade.) Este jardim é muito mais recente que o templo.Trata-se de um exemplar de karensansui, jardim seco japonês, com gravilha "penteada" (aqui representando o mar ondulado) e pedras (ilhas).
Estes jardins têm um ponto de observação que lhes é próprio: devem ser olhados desde aquela parte da construção que é ocupada pelo monge abade. Nesta imagem esse ponto está nas salas à direita, de que apenas se vislumbra o passadiço de comunicação com o exterior.
Estes jardins têm um ponto de observação que lhes é próprio: devem ser olhados desde aquela parte da construção que é ocupada pelo monge abade. Nesta imagem esse ponto está nas salas à direita, de que apenas se vislumbra o passadiço de comunicação com o exterior.
Jardim Hojo. Note-se aqui que, ao jardim seco, se acrescenta uma "paisagem emprestada": as pedras e árvores que se vêem ao fundo do jardim remetem o olhar par as montanhas circundantes. Essa paisagem é, assim, "emprestada" ao jardim.
Note-se que, na perspectiva desta foto, não estamos a ver o que veria o abade desta comunidade. Sendo assim, esta visão é uma visão imprópria deste jardim. Pode haver, de um jardim, visões impróprias?
Não se caminha sobre este jardim, não é essa a forma de o ver ou de ter em mente. Nem sempre, no entanto, um jardim destes tem apenas um ponto de observação (pode ter vários).
Note-se que, na perspectiva desta foto, não estamos a ver o que veria o abade desta comunidade. Sendo assim, esta visão é uma visão imprópria deste jardim. Pode haver, de um jardim, visões impróprias?
Não se caminha sobre este jardim, não é essa a forma de o ver ou de ter em mente. Nem sempre, no entanto, um jardim destes tem apenas um ponto de observação (pode ter vários).
No mesmo templo, outro tipo de jardim.
Haikai é uma forma particularmente breve e nobre de poesia japonesa: dezassete (5-7-5) sílabas. Deixamos um desses poemas, em tradução de Armando Martins Janeira.
Ah! o velho poço!
uma rã salta
som da água.
(Esta tradução aparece no "Prólogo da Segunda Edição" da obra Relance da Alma Japonesa, de Wenceslau de Moraes.)
Haikai é uma forma particularmente breve e nobre de poesia japonesa: dezassete (5-7-5) sílabas. Deixamos um desses poemas, em tradução de Armando Martins Janeira.
Ah! o velho poço!
uma rã salta
som da água.
(Esta tradução aparece no "Prólogo da Segunda Edição" da obra Relance da Alma Japonesa, de Wenceslau de Moraes.)
Cabe acreditar que um ocidental racionalista do século XXI vê neste detalhe o mesmo sentido que lhe davam os contemporâneos do seu criador?
Faça-se agora aqui um interlúdio para falar de Budismo Zen, a seita budista com maior influência na arquitectura japonesa.
O budismo foi oficialmente aceite no Japão no ano de 594, pelo príncipe Shotoku. O Budismo Zen torna-se preponderante no Período Kamakura (1185-1392), dominado pelo poder da classe militar (os samurai) com o shogun no cume do poder temporal (o imperador era um deus-vivo meramente decorativo).
O Budismo Zen substituiu os rituais intrincados e apalaçados (que agradavam aos cortesãos) pela austeridade, simplicidade, controlo do corpo e da mente (que os samurai consideravam mais convenientes). Com o Zen, o jardim deixa de ser um lugar para deliciar os sentidos (o que convinha aos cortesãos como lugar de ócio culto, onde se podia por exemplo ler e escrever poesia) e passa a desempenhar um papel na via para a iluminação. O jardim é um apoio à meditação.
[Uma leitura conveniente para compreender a relação entre história, cultura e jardins no Japão é, de Marc Treib e Ron Herman, A Guide to the Gardens of Kyoto, da editora Kodansha International.]
Faça-se agora aqui um interlúdio para falar de Budismo Zen, a seita budista com maior influência na arquitectura japonesa.
O budismo foi oficialmente aceite no Japão no ano de 594, pelo príncipe Shotoku. O Budismo Zen torna-se preponderante no Período Kamakura (1185-1392), dominado pelo poder da classe militar (os samurai) com o shogun no cume do poder temporal (o imperador era um deus-vivo meramente decorativo).
O Budismo Zen substituiu os rituais intrincados e apalaçados (que agradavam aos cortesãos) pela austeridade, simplicidade, controlo do corpo e da mente (que os samurai consideravam mais convenientes). Com o Zen, o jardim deixa de ser um lugar para deliciar os sentidos (o que convinha aos cortesãos como lugar de ócio culto, onde se podia por exemplo ler e escrever poesia) e passa a desempenhar um papel na via para a iluminação. O jardim é um apoio à meditação.
[Uma leitura conveniente para compreender a relação entre história, cultura e jardins no Japão é, de Marc Treib e Ron Herman, A Guide to the Gardens of Kyoto, da editora Kodansha International.]
Santuário Xintoísta de Heian (Quioto)
Visão de conjunto do santuário de Heian e seus jardins. Imagem do bilhete de entrada no espaço.
Este santuário data de 1895, mas foi construído no estilo do Período Heian (785-1184), com a diferença de que é uma espécie de miniatura: os edifícios têm apenas cerca de 2/3 do que seria a sua dimensão usual.
Este santuário data de 1895, mas foi construído no estilo do Período Heian (785-1184), com a diferença de que é uma espécie de miniatura: os edifícios têm apenas cerca de 2/3 do que seria a sua dimensão usual.
O Torii gigante, à aproximação ao santuário, marca com nitidez um espaço sagrado dentro do espaço público.
O Xintoísmo teve origem numa mistura de culto dos antepassados mortos e de crenças indígenas em kami (divindades). Essas divindades normalmente não tomavam a forma de imagens, mas antes de lugares naturais considerados santos. Formas topográficas raras, como o Monte Fuji, com a sua forma cónica pura, eram consideradas manifestações de kami. Esses sítios eram lugares de encontro das divindades e dos humanos: não era preciso chegar ao céu para ter esse encontro.
Por isto, um santuário (um lugar santo) é mais uma construção mental do que uma estrutura física. Os espaços sagrados são assinalados por portas (torii) como a que vemos na imagem, ou ainda por vedações, cordas ou faixas de pano.
O Xintoísmo teve origem numa mistura de culto dos antepassados mortos e de crenças indígenas em kami (divindades). Essas divindades normalmente não tomavam a forma de imagens, mas antes de lugares naturais considerados santos. Formas topográficas raras, como o Monte Fuji, com a sua forma cónica pura, eram consideradas manifestações de kami. Esses sítios eram lugares de encontro das divindades e dos humanos: não era preciso chegar ao céu para ter esse encontro.
Por isto, um santuário (um lugar santo) é mais uma construção mental do que uma estrutura física. Os espaços sagrados são assinalados por portas (torii) como a que vemos na imagem, ou ainda por vedações, cordas ou faixas de pano.
Lago do jardim do santuário de Heian. Já o jardim não é para ser visto de um ponto fixo, nem mesmo de um pequeno conjunto de pontos fixos. O jardim é agora caminho de caminhar, da caminhada que nos transforma por nos dar que ver e que pensar. Caminho que nos prepara, porque as vistas mudam e tal coisa muda a nossa disposição. Andamos no mundo como andamos atravessando o lago pelo caminho das pedras: parte do tempo temos de olhar para os pés, para não tropeçarmos e não irmos à água. Em recompensa, quando de novo levantamos os olhos, descobrimos do jardim (da vida) uma nova vista. Após cada passo, sabendo olhar.